A importância do stress e seu controle nas doenças cardiovasculares

As doenças cardiovasculares (DCV) têm expressiva incidência na população e trazem uma série de limitações para a qualidade de vida daqueles que delas sofrem. A World Health Organization (2013) estima que DCV causem, globalmente, cerca de 17 milhões de mortes por ano, quase um terço do total, configurando-se assim como a causa número um de morte no mundo. A hipertensão arterial contribui sobremaneira para tais dados, contando com 9,4 milhões de mortes a cada ano, sendo responsável por 45% das mortes por doença cardíaca e 51% das mortes por acidente vascular cerebral. Além disso, estima-se que até o ano de 2030 cerca de 23,3 milhões de pessoas morrerão anualmente por DCV. No Brasil, as DCV são responsáveis por cerca de 20% das mortes de indivíduos acima de 30 anos (Mansur & Favarato, 2012). Segundo as VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão (SBC, SBH & SBN, 2010), no ano de 2007 foram registradas 1.157.509 internações por DCV no Sistema Único de Saúde (SUS) e, no que diz respeito a gastos financeiros, no ano de 2009 as 91.970 internações devido a essas doenças geraram um custo superior a 165 milhões de reais.

Os fatores de risco para DCV, segundo as VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial (2010) apresentam-se de forma agregada, observando-se famílias que possuem um estilo de vida pouco saudável além de fatores genéticos e ambientais que, em conjunto, as predispõem ao desenvolvimento da doença.  Embora esses fatores já estejam claramente associados às DCV, estudos que propõem intervenções não medicamentosas que possam contribuir, junto ao tratamento médico, para o controle da doença mostram-se bastante úteis. Para que uma intervenção não medicamentosa traga resultados positivos, é importante que esta tenha como meta atuar sobre os fatores de risco da doença de modo a contribuir para mudança no estilo de vida. Tal mudança deve envolver o estímulo para o desenvolvimento de hábitos saudáveis e o controle de variáveis emocionais que possam estar dificultando a adesão ao tratamento e favorecendo a manutenção da doença. Como enfatizam Whittaker et al (2012) já foi comprovada a existência de relação de múltiplas variáveis ​​psicossociais com o desenvolvimento e progressão da DCV, tais como depressão e ansiedade. Além disso, o stress emocional tem sido tema de grande interesse entre pesquisadores da área da saúde, como o estudo de Lopes (2012) no qual se investigou os estilos de vida de pacientes com cardiopatia isquêmica, concluindo-se que o stress é uma das variáveis preditoras de estilos de vida não saudáveis. Mais recentemente, Borges et al (2013) estudaram indivíduos que tiveram Síndrome Coronariana Aguda (SCA) e concluíram sobre a relação entre tais eventos e a exposição a estímulos estressantes. Os resultados encontrados levam à valorização do stress como um fator propiciador de estilos de vida deficitários, levando à reflexão quanto à relação do mesmo com as DCV.

Estudos com hipertensão, importante fator de risco para DCV, também têm apontado na direção da importância do stress como fator de risco para a doença. Tais estudos têm contribuído para o conhecimento na área, tais como estudo de Lipp (2005) e Lipp et al (2006) nos quais estudou-se a reatividade na pressão sanguínea frente a situações experimentais de stress social, concluindo-se pela relação entre as variáveis. Além disso, o estudo de revisão da literatura feito por Fonseca et al (2009) encontrou dados confirmatórios quanto à influência de fatores emocionais, como ansiedade, raiva e stress na hipertensão arterial na reatividade cardiovascular. No estudo de revisão realizado por Ozbay et al (2007), os autores enfatizam que o  sistema nervoso simpático (SNS) e o sistema hipotalâmico-pituitário-adrenocortical (HPA) estão amplamente envolvidos na resposta ao stress. Ao mesmo tempo alguns estudos relacionaram a hiperresponsividade do sistema nervoso simpático (também chamada de reatividade cardiovascular) à indução de isquemia e ao desenvolvimento de hipertensão, durante o stress mental (Rozanski et al., 1999). Além disso, Flaa, Eide, Kjeldsen e Rostrup (2008) demonstraram que as respostas da norepinefrina plasmática ao stress mental podem prever a ocorrência de hipertensão arterial. Dessa forma, este estudo evidencia que a atividade do sistema nervoso simpático durante o stress mental revela-se preditora de pressão arterial no futuro, indicando um possível fator causal para o desenvolvimento da hipertensão essencial independente da pressão arterial inicial. Tais estudos revelam a relação entre o stress e o sistema cardiovascular em termos fisiológicos, o que muito contribui para a compreensão da mesma.

Com base em estudos que enfatizam a associação entre hipertensão, DCV e fatores emocionais como o stress, evidencia-se a importância do controle do stress como uma medida que pode contribuir para a prevenção e controle da doença. Partindo-se do princípio de que as DCV estão associadas a um estilo de vida deficitário, o Treino de Controle do Stress de Lipp (TCS)  (Lipp, 1991a) tem se revelado de grande utilidade, já que esse procedimento envolve mudanças nos hábitos e melhoria da qualidade de vida nas diversas áreas o que pode impactar positivamente na prevenção e no tratamento das DCV. O TCS de Lipp vem sendo testado em várias pesquisas com doenças crônicas diversas (Lipp, 1991b, Brasio, 2003, Malagris, 2009) demonstrando resultados bastante positivos, já tendo sua eficácia comprovada. Visa a conscientização dos pacientes quanto às suas fontes externas e internas de stress e a aprendizagem de estratégias cognitivo-comportamentais que ajudem no controle do stress. Neste treinamento é ensinado aos pacientes estratégias tanto de manejar como para eliminar fontes de stress (Lipp, Bignotto & Alcino, 1997; Alcino, 1996; Lipp, Alcino, Bignotto & Malagris, 1998; Lipp, 2003; Lipp & Malagris, 2011, Malagris, Lipp & Chicayban, 2014). Concluindo, o TCS somado ao tratamento médico tem sido valorizado inclusive nas V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão, onde se recomenda o controle de situações estressantes junto às outras recomendações como alimentação adequada, exercício físico, cessação de fumo e controle do uso de álcool (SBC, SBH & SBN, 2006). Pela relevância do tema, o mesmo foi discutido na mesa redonda intitulada “A interface entre questões emocionais e doenças cardiovasculares” na Jornada de Psicologia do 31º Congresso de Cardiologia da SOCERJ.

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Por Profª Lucia Emmanoel Novaes Malagris

Instituto de Psicologia – Universidade Federal do Rio de Janeiro

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