O Cardioversor Desfibrilador Implantado (CDI) é um dispositivo inserido que tem como objetivo corrigir as arritmias ventriculares potencialmente letais através de descargas elétricas, que estimulam o coração, proporcionando uma sobre vida ao portador. Seu uso tornou-se padrão para pacientes reduzindo o índice de mortalidade em 30% a 54% [1]. Todavia estudos apontam para um declínio na área psicossocial e na qualidade de vida dos pacientes [1], entre 30% a 60% dos pacientes CDI apresentam diversas complicações psicológicas, como transtornos de ansiedade e episódios depressivos. [2]
Para alguns pacientes, o choque é um evento extremamente desagradável, tanto físico quanto emocional e a sensação causada pela descarga elétrica pode ser comparada a um “chute no peito”, e em uma escala de dor 0 a 10, recebe escore 6 [3, 4]. Devido à tensão e ao medo de receber um choque repentino, bem como, o medo do dispositivo não funcionar corretamente ou receio de alguma atividade do cotidiano causar uma descarga elétrica, a população CDI mostra-se vulnerável ao surgimento de sintomas ligados a transtornos de ansiedade e episódios depressivos [5].
Estudos apontam que 24% a 37% dos pacientes portadores do CDI apresentaram aumento dos sintomas de ansiedade, e 13% a 35% são clinicamente diagnosticados com transtorno de ansiedade [6]. A depressão acomete entre 13% a 21% dos pacientes [6]. Ainda em outra pesquisa, a prevalência de sintomas de depressão após o implante de CDI, onde foram avaliados 645 pacientes, identificaram 14% de leve depressão, 4% depressão de moderada a grave após o primeiro choque [7].
Estudos indicam que a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é uma ferramenta eficaz no gerenciamento de estresse e sintomas ligados a ansiedade, bem como a minimização de pensamentos catastróficos ligados aos sintomas depressivos em pacientes com CDI [5,6, 8]. O pensamento disfuncional mais frequente é de que o dispositivo não vai funcionar corretamente, levando-os a morte e que a realização de atividades físicas pode alterar o funcionamento do aparelho [1]. Em decorrência do medo e da ansiedade causados por pensamentos catastróficos, o paciente assume um comportamento de esquiva diante de atividades de lazer, exercícios físicos e na atividade sexual [6]. O objetivo da psicoterapia para esses pacientes visa aprimorar a qualidade de vida através de um levantamento de habilidades que fortalecerão a autoconfiança frente ao uso do dispositivo, bem como, o ganho psicossocial [9], tornando-se funcional como um primeiro cuidado pré e pós cirúrgico. Por meio da psicoeducação, os pacientes tendem a rebaixar os níveis de ansiedade e sintomas depressivos, ligados ao medo constante de receber uma descarga elétrica, e ainda promovem um melhor gerenciamento do estresse e o retorno do paciente às atividades cotidianas [6-9].
Além disso, a TCC tem como princípio básico modificar crenças e comportamentos disfuncionais que produzem pioras nos estados de humor [10].
Quando ocorre a reestruturação cognitiva, a forma de pensar se torna mais coerente e condizente com a realidade, o que promove os enfrentamentos habituais das situações comuns e a melhora de qualidade de vida nesses pacientes. Nesse processo, pode-se recorrer também a um cardiologista para esclarecer dúvidas referentes ao uso e funcionamento do dispositivo.
Referências:
- Dunbar SB. Psychosocial Issues of Patients with Implantable Cardioverter Defibrillators. American Journal of Critical Care. 2005. Vol.14. 294—303.
- Hegel MT, Griegel LE, Black C, et al. Anxiety and depression in patients receiving implanted cardioverter defibrillators: A longitudinal investigation. Int J Psychiatry Med 1997; 27: 13. 57-69.
- Burgess ES, Quigley J F, Moran G, Sutton FJ, Goodman M. Predictors of psychosocial adjustment in patients with implantable cardioverter defibrillators. Pacing Clin Electrophysiol. 1997. Vol. 20. 1790—1795.
- Ahmad M, Bloomstein L, Roelke M, Bernstein AD, Parsonnet V.. Patients’ attitudes toward implanted defibrillator shocks. Pacing and Clinical Electrophysiology. 2000; 23, 934–938.
- Smith LC, Fogel D, Friedman S. Cognitive-behavioral treatment of panic disorder with agoraphobia triggered by AICD implant activity. Psychosomatics: Journal of Consultation Liaison Psychiatry. 1998. Vol. 39. 474—477.
- Kohn CS, Petrucci RJ, Baessler C, et al. The effect of psychological intervention on patients long-term adjustment to the ICD: a prospective study. Pacing Clin Electrophysiol 2000; 450 – 6.
- Whang W, Albert CM, Sears SF Jr, Lampert R, Conti JB, Wang PJ, Singh JP,Ruskin JN, Muller JE, Mittleman MA; TOVA Study Investigators. Depression as a predictor for appropriate shocks among patients with implantable cardioverter-defibrillators: results from the Triggers of Ventricular Arrhythmias (TOVA) study. J Am CollCardiol. 2005 Apr 5;45(7):1090-5.Sears SF Jr, Todaro JF, Lewis TS, et al. Examining the psychosocial impact of implantable cardioverter defibrillators: a literature review. Clin Cardiol 1999; 22(7):481- 9.
- Lewin RJ, Coulton S, Frizelle DJ, et al. A brief cognitive behavioural preimplantation and rehabilitation programme for patients receiving an implantable cardioverter-defibrillator improves physical health and reduces psychological morbidity and unplanned readmissions. Heart 2009;95(1):63-9.
- Frizelle DJ, Lewin RJ, Kaye G, et al. Cognitive-behavioural rehabilitation programme for patients with an implanted cardioverter defibrillator: a pilot study. Br J Health Psychol ; 2004;9(Pt3):381 – 92.
Por Ana Claudia Corrêa de Ornelas Maia
Psicóloga – CRP 05/18782 – Especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental (WOLPE)– Mestre em Sexologia e Terapia de Casal (UGF/RJ) – Doutoranda em Psiquiatria e Saúde Mental – Pesquisadora do Laboratório de Pânico e Respiração – Instituto de Psiquiatria (IPUB/UFRJ) – Linha de pesquisa “Comorbidades psiquiátricas, qualidade de vida e primeiros cuidados em pacientes com Cardioversor Desfibrilador Implantável”.
Membro da comissão científica da SOCERJ 2014 – Este texto é um recorte de um artigo aceito para publicação em janeiro de 2014 no Brazilian Journal of Medical and Biological Research e será apresentado em Mesa Redonda na programação de Contribuições da Psicologia na Cardiologia no Congresso de Cardiologia no Rio de Janeiro (SOCERJ) em abril de 2014.