O Africano

O Africano – Le Clézio – Editora – CosacNaify, 117 páginas

“O africano” é um livro de Gustave Le Clézio, ganhador do Prêmio Nobel de Literatura de 2008. Nascido na França, em 1940, ele só conhece o pai em 1948, após o fim da 2ª. Grande Guerra, quando após viagem com sua mãe e irmão para a Nigéria, o encontra pela primeira vez. Seu pai era médico de campanha, tendo chegado à África em 1928. Durante a ocupação nazista foi impedido de voltar à França. Viveu mais de 20 anos como o único médico em territórios maiores que muitos países.

O próprio Le Clézio apresenta o livro:

“…Por muito tempo sonhei que minha mãe era negra. Inventei-me uma história, um passado, para escapar da realidade em meu retorno da África… Depois descobri, quando meu pai, na idade da aposentadoria, retornou para viver conosco na França, que o Africano era ele. Foi difícil admitir isso. Tive de voltar atrás, de recomeçar, de tentar compreender. Em memória disso escrevi esse pequeno livro”

E deixa claro sua posição anticolonialista:
“Se leio romances “coloniais” escritos por ingleses dessa época, nada reconheço…aquele torpor colonial, os ridículos da sociedade branca em seu exílio na costa, todas as mesquinharias às quais as crianças são particularmente sensíveis, o desprezo pelos indígenas, dos quais eles conheciam apenas a parcela de empregados domésticos, que tinham de se curvar aos caprichos dos filhos de seus senhores, e sobretudo aquela espécie de panelinha em que as crianças de mesmo sangue são simultaneamente reunidas e divididas, onde percebem um reflexo irônico de seus defeitos e suas mascaradas, e que constitui de algum modo a escola da consciência racial que supre para elas o aprendizado da consciência humana – posso dizer que, graças a Deus, tudo isso me foi de todo estranho”.

A descrição desses anos do pai na África não poderia ser mais recente:
“Longos anos de afastamento e silêncio, durante os quais continuou a exercer seu trabalho de médico de emergências, sem remédios, sem material, enquanto no mundo, por toda parte, as pessoas se matavam ”…

“…é uma região onde a guerra é permanente, a guerra dos homens entre si, a guerra da pobreza, a guerra dos maus-tratos e da corrupção herdados da colonização e, sobretudo, a guerra microbiana”

Le Clézio reconta a história do pai, escreve para o compreender, para reencontrar “o que está definitivamente ausente de minha infância: ter tido um pai, ter crescido junto dele na doçura da intimidade familiar”. Ao mesmo tempo expõe a África subjugada no seu cotidiano pelo colonialismo e pelo “…esquecimento tático no qual as grandes potências coloniais deixavam o continente que tinham explorado”

“O africano” é um livro para se ler de uma vez só, em profundo silêncio.

Por Dra. Ana Mallet

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