Pseudoaneurisma da Fibrosa Intervalvar Mitro-aórtica (FIMA), Complicado com Fístula para o Átrio Esquerdo

 

Autores:

José Luiz Fernandes Molina Filho (R3 ECO – INC)

Annie Coutinho (PG3 ECO – INC)

Orientador:

Prof. Dr. Cesar A. S. Nascimento (Preceptor ECO – INC)

Créditos:

Dra. Clara Weksler (Chefe Serviço Orovalvar – INC)

Dr. Luciano Belem (Chefe Serviço ECO – INC)

Dra. Márcia Freitas (Coordenadora COREME – INC)

Dr. Oscar Brito (Cirurgião Cardíaco – INC)

# Identificação: G.O.S., feminina, 34 anos, negra, natural e residente no RJ, vendedora, 2º grau completo, solteira.

# Queixa Princial: “Cansaço”

# História da Doença Atual: Em Outubro de 2009 iniciou quadro de palpitação e dispnéia aos esforços classe funcional II da NYHA (ex.: correr, subir escada). Após cerca de 3 meses evoluiu com piora da classe funcional, passando a apresentar dispnéia em repouso e ortopnéia. Neste momento foi diagnosticado quadro de pneumonia comunitária associado à derrame pleural, tratada ambulatorialmente com Levofloxacina. Após tratamento do quadro infeccioso, retornou à classe funcional II, estando com a sintomatologia estável. Compareceu para realização de ecocardiograma transtorácico de acompanhamento.

# História Patológica Pregressa:

Refere diagnóstico de cardiopatia em Fevereiro de 2010, não fazendo uso regular de nenhuma medicação (prescrito, porém paciente não faz uso por referir intolerância).

Nega HAS, DM, DLP, IAM, procedimentos cardiovasculares, endocardite, história de trauma, internações prévias, alergias, hemotransfusões, hepatite, tuberculose.

# História Ginecológica: Menarca aos 14 anos. G0P0A0. Faz uso de anticoncepcional hormonal oral (pílula combinada).

# História Social.: Nega tabagismo, etilismo ou uso de drogas ilícitas.

# História Familiar.: Mãe com 61 anos e regurgitação mitral leve (SIC). Nega história familiar de DAC.

# EXAME FÍSICO:

Vigil, orientada, bom estado geral, estado nutricional preservado, assintomática em repouso.

Hidratada, corada, acianótica, anictérica.

PA: 120 x 70 mmHg (ambos os MMSS)   FC: 80 bpm

ACV: Pulsos arteriais simétricos, com amplitude preservada. Ictus de VE não visível, palpável no 5º EICE. Frêmito palpável em ponta do VE. RCR 2T, com apagamento de B1. Sopro holossistólico +++++/6+ audível em todo o precórdio e sopro circular de Miguel Couto.

AR: MVUA, sem RA.

ABD: flácido, peristáltico, indolor, sem massas ou VMG.

MMII: sem edema, pulsos simétricos, com amplitude preservada.

# ECG: Ritmo sinusal com FC 78 bpm. âQRS em + 60°. Sobrecarga ventricular esquerda.

sobrecargaventricularesquerda

# Ecocardiograma:

1 – Imagem tridimensional (3D) do extenso pseudoaneurisma fistulizando para o atrio esquerdo

pseudoaneurismafistulizandoatrioesquerdo

2- Exame com fluxo a cores demonstra a dinamica do refluxo mitral para o pseudoaneurisma ostensivo em torno do anel mitral. – http://youtu.be/L9OsU1vc0UA

3- Demonstra a prótese biologica apos a cirurugia com recuperação da competência sistólica da válvula mitral, permanecendo refluxo peri-protético leve e insuficiência aórtica devido ao ostensivo comprometimento da fibrosa mitro-aórtica. http://youtu.be/2y0s5QqYFuU

# IMPRESSÃO: Mulher jovem, sem comorbidades conhecidas, apresenta pseudoaneurisma da fibrosa intervalvar mitro-aórica (FIMA) idiopático, com fístula para o átrio esquerdo. Evoluindo com sintoma de dispnéia aos esforços, regurgitação VEàAE grave (regurgitação mitral + fístula), já com aumento de cavidades esquerdas e hipertensão pulmonar.

# CONDUTA: A paciente foi encaminhada para correção cirúrgica do pseudoaneurisma. Procedimento com grande dificuldade técnica devido à extensa fragilidade da FIMA. Realizado fechamento do pseudoaneurisma e da fístula VE à AE com patch de pericárdio bovino na face ventricular, além da troca valvar mitral biológica número 27. Não foi evidenciado infiltrado inflamatório ao histopatológico da peça cirúrgica.

Apresentou boa evolução clínica no pós-operatório, porém houve surgimento de regurgitação aórtica moderada devido à alteração arquitetural da FIMA após correção. No momento, encontra-se em seguimento clínico ambulatorial.

# DISCUSSÃO e CONCLUSÃO:

O pseudoaneurisma da FIMA trata-se de uma entidade rara e geralmente relacionada a algum fator genético, associada à endocardite e ao trauma e/ou manipulação cirúrgica prévia. O caso descrito ganha notoriedade por ser idiopático, por envolver praticamente todo o anel que após laboriosa correção cirúrgica com prótese biológica estendeu sua repercussão para a válvula aórtica demonstrando a fragilidade de toda a FIMA ocasionando uma insuficiência aórtica residual a cirurgia.

As formas mais comuns de apresentação são sinais de endocardite em atividade ou dispnéia e insuficiência cardíaca.

As complicações mais relatadas são as fístulas e a compressão de coronárias (mais comumente a circunflexa), porém a complicação mais dramática é a ruptura do pseudoaneurisma para o pericárdio.

Apesar da conduta cirúrgica ser o tratamento de escolha para o pseudoaneurisma da FIMA, deve-se avaliar criteriosamente cada caso, uma vez que existe a possibilidade de uma doença difusa da FIMA, trazendo dificuldade ao procedimento e potencial para recidiva.

No caso clínico em questão foi optado pela conduta cirúrgica tendo em vista a repercussão já causada pelo pseudoaneurisma fistulizado (sintomas associados à sobrecarga do VE), bem como ao potencial de progressão e  complicações, inclusive a possibilidade de disjunção A-V.

A paciente apresentava dois fatores relacionados à desfecho adverso em caso de não intervenção: fístula do pseudoaneurisma para câmaras cardíacas, e tamanho do pseudoaneurisma > 3 cm (4 cm neste caso) e até disjunção A-V pois envolvimento mostrou-se ostensivo em torno do anel mitral .

Figura acima: Pseudoaneurisma da FIMA com fístula para o AE.

Figura acima: Pseudoaneurisma da FIMA com fístula para o AE.

 

Referência Bibliográfica:

  1. Gomes EI, Reis NB, Barreto Neto M et al  – Forma rara de aneurisma cardíaco de etiologia reumática simulando doença mitral.  Arquivos de Clinica, Brasil  1949, vol IX, julho.
  2. Covisart, J.N. A Treatise on the Diseases and Organic Lesions of the Heart Trans. C. H. Hebb. London, 1813.
  3. Sudhakar,S; Sewani, A.; Agrawal,M et al -Pseudoaneurysm of the Mitral-Aortic Intervalvular Fibrosa (MAIVF): A Comprehensive Review. J Am Soc Echocardiogr 2010;23:1009-18.
  4. Abrahms D G, Barton C. J., Cockshott Petter, et al. Annular  Subvalvar  Left Ventricular Aneurysms. Quart J Med 31: 345-60, 1962.
  5. Chesler E, Schamroth L., and Meyers. Annular Subvalvar left ventricular aneurysms in South African Bantu. Circulation 32: 43-51, 1965.
  6. Chesler E., Edin MRCP, Tucker RBK, et al  Subvalvar and apical Left Ventricular Aneurysms in the Bantu as a Source of Systemic Emboli. Circulation, 1967; 35: 1156-1162.
  7. Rittoo D, Sutherland GR – Posterior left ventricular pseudoaneurysm After aortic valve replacement in a patient with rheumatoid arthritis: diagnosis by transesophageal echocardiography. J Am Soc Echoe 1994; 7:429-3.
  8. Bassan R. Jasbik W Souza MA Nogueira AA, et al – Subvalvular left ventricular pseudoaneurysm: a rare complication of mitral valve replacement.  Cath Cardiov Diagnosis 7:269-273 (1981).
  9. Ferreira P A M, Moraes A N, Lima F A, Lima FA et.al., Aneurisma Íntegro de Seio de valsalva dissecando septo interventricular. Revista Brasileira de Ecocardiografia. Supl Esp Maio, 1995: 40.
  10. Gonçalves M, Paiva J, Linhares C, Rego S. Aneurisma Congênito do Ventrículo esquerdo. Revista Brasileira de Ecocardiografia. Supl Esp Maio, 1996.
  11. Rodrigues JJ, Santos S C C, Teixeira E A, et al, Aneurisma anular subvalvar de ventrículo esquerdo.  Relato de 05 casos , histórico e revisão da literatura. Rev.Bras.deEcocardigrafia, 1995; 23: 08-16.
  12. Nascimento C A S, Rocha AF, Bastos ES, et al. Importância do Eco DopplerCardiograma Transesofágico do Diagnóstico  do Pseudo-Aneurisma Subanular do VE após troca protética valvar. Suppl. Revista Brasileira  de Ecocardiografia, 1997.
  13. Nascimento C. A S, Baptista F S, Turano M, et.al., Nove Casos de Pseudo-Aneurismas Anulares da Junção Mitro-Aórtica pela Ecocardiografia Transesofágica. Suppl. Revista Brasileira de Ecocardiografia Ano VIII – 2001; 5: 50.
  14. Gialloreto OP Loiselle G – Aneurysm of aortic sinus of Valsalva associated with high   ventricular septal  defect. Am J Cardiol 11:537, 1963.
  15. Lee EB, Krieger OJ. Lee NK – Congenital aneurysm of the noncoronary sinus of valsava   leading to complete heart block: case report.  Ann Int Med 45:525, 1956.
  16. Brandt J. Jögi P, Lührs C – Sinus of valsalva aneurysm obstructing coronary arterial flow: case  report and collective review of the literature. Eur Heart J 6: 1073, 1985.
  17. 18.Ferreira PAM, Moraes NA, Lima FA, et.al. Pseudoaneurisma da Junção Atrio-Ventricular  como  complicação de Stafilococcia. Revista Brasileira de Ecocardiograma. Supl Esp 1995: 40.
  18. Bansal RC, Moloney PM, Marsa RJ, Jacobson JG – Echocardiographic features of a mycotic aneurysm of the left ventricular outllow tract eaused by perforation of mitral-aortic intervalvular fibrosa.  Circulation. 4:930-934, 1983.
  19. Sejopoles MD, Barros MVP, Barbosa C, et al. Diagnostico pelo Ecocardiograma Transesofágico de Abscesso Periprotético  Aórtico com extensão para septo interatrial. Revista Brasileira de Ecocardiografia. Supl Esp 1996: 15.
  20. Davis MD, Caspi A, Lewis BS, Milner S. Colsen PR, Barlow JB – two-dimensional echocardiographic features of submitral left ventricular aneurysm. Am Heart J, 103:289, 1982.
  21. Ascah KJ, Patrick E, Chilton C, Zawalick B, Bedard P – Atypical pseudoaneurysm after mitral valve replacement: Doppler echocardiographic diagnosis. J Am Soc of echo 1991; 4: 625-30.
  22. Adler r, Ortiz J Matsumoto AY et al –  Aspectos ecocardiográficos do pseudo-aneurisma da zona fibr osa  intervalvar mitro-aórtica. Arq Brás Cardiol 1985; 45:53-5.
  23. Stoddard ME, Dawkins PR, Longaker RA, et al – Transesophageal echocardiography in the detection of left ventricular pseudoaneurysm. Am Heart J 1993; 125-634.
  24. Esakof  DD, Vannan MA, Pandian NG, Cao QI, Schwartz Sl, Bojar RM – Visualization of left ventricular pseudo aneurysm with panoramic transesophagel  echocardiography. J Am S Echo1994; 7: 174-8.
  25. Afidi I, Apostolidon MA, Saad RM, Zoghbi WA – Pseudoaneurysms of the mitral-aortic intervalvular fibrosa: dynamic characterization using Transesophageal echocardiographic.JACC1995;25:137-45.
  26. Alam M, Glick C, Garcia R, Lewis JW Jr – Transesophageal echocardiographic features of left ventricular pseudoaneurysm resulting after mitral valve replacement surgery.  Am HeartJ. Janeiro 1992.
  27. Sakai Kichiro, Nakamura K. Ishizuka N, Nakagawa M, Hosoda S – Echocardiographic findings and clinical features of left ventricular pseudoaneurysm after mitral valve replacement.  Am Heart J 1992; 124-975.
Você também pode gostar:

Mais postagens como esta…

Menu
Podemos te ajudar?